VOCÊ NÃO ESTÁ NA PÁGINA PRINCIPAL. CLIQUE AQUI PARA RETORNAR





domingo, maio 21, 2006

Capítulo 7

Escritor Arruinado


O livro estava escrito. Levou sete ou oito meses de intenso labor, além das muitas horas em conferencias e estudos. Com o orgulho próprio a um jovem estudioso, João Calvino levou seu manuscrito ao tipografo cuja oficina se encontrava sob a tabuleta dos Dois Galos. Tinha vendido alguns dos seus pertences para custear parte do custo de impressão. O resto do dinheiro lhe havia sido em- prestado. O livro foi dedicado ao seu amigo de infância, Claude de Hangest, sobrinho do bispo de Noyon. Claude era agora o abade do mosteiro de Saint Eloi, em Noyon. "Aceite este, o primeiro dos meus frutos", escreveu João Calvino, "pois pertence- lhe por direito, porquanto devo-lhe o que sou e o que tenho, e,espe- cialmente, porque fui criado quando menino em sua casa."
Em abril de 1532, o livro saiu da tipografia. Era um ensaio sobre Sêneca, o filósofo romano que foi contemporâneo do apostolo Paulo. Os eruditos da época gostavam de assim fazer ler famosos e antigos manuscritos e então escrever sobre eles. Como o primeiro livro de um autor com somente vinte e dois anos de idade, o Comentário de João Calvino sobre Sêneca era, de fato, uma obra admirável. Foi escrito em excelente latim. Havia citações de cinqüenta e seis escritores latinos, de vinte e dois autores gregos, sete santos padres da igreja, além de autores contemporâneos. Havia somente três pequenas referencias bíblicas.
Mas o livro não vendia. Quase ninguém tomou conhecimento da sua publicação. João Calvino implorava aos seus amigos para que comprassem o livro, que o recomendassem a outros, que pedissem aos seus professores que o usassem. Enviou um exemplar ao sábio Erasmus em Basel. Mesmo assim o livro não era vendido. Já era ruim um jovem autor ser ignorado; pior era ficar endividado pela publicação do livro. Mesmo assim, não era essa a vida que ele queria? Uma vida desembaraçada para estudar e escrever. Sim, era esse o seu desejo. Mas, pensava consigo mesmo, quem sabe a hora fosse propicia para concluir o curso de direito que havia sido interrompido pela morte de seu pai. As pequenas malas de livros e outros pertences foram remetidos para Orléans. Seguiu-os o seu dono, a pé.
A fama do magro e brilhante aluno que jamais ia as festas ainda perdurava em Orléans desde o ano em que João Calvino lá estudara. Com evidente respeito, os alunos que vieram da província de Picardy elegeram-no como procurador para cuidar dos seus assuntos. Resmungaram, porém, quando ele deixou de promover uma festa para celebrar sua eleição, dando o dinheiro que seria usado na festa para a compra de novos livros para a biblioteca da universidade. Mas respeitavam-no sempre.
Novamente, João Calvino permaneceu um ano em Orléans. Saiu repentinamente, chamado a Noyon pelo seu irmão Charles, cujos problemas com a igreja aumentava. O curso de direito estava quase concluído, mas João, aparentemente, não esperou pelo grau de doutor. De volta a casa na praça do mercado, observava as demonstrações contra os hereges conhecidos como luteranos. Compareceu a uma reunião do clero, do qual ainda era membro oficial. Não se conhecem as suas atividades a favor do seu irmão Charles nessa ocasião.
Era setembro de 1533 quando João Calvino voltou a Paris, hospedando-se na Casa do Pelicano com Etienne de la Forge, um mercador de tecidos.
Dali a três meses João Calvino estaria fugindo para salvar sua vida.