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terça-feira, maio 16, 2006

Capítulo 5

I. Confirmação no Entendimento

Visto que a santidade tem a ver com o entendimento, ela é geralmente chamada nas Escrituras de luz e conhecimento. A confirmação e crescimento nesta área, consiste nas sete partes a seguir:
1. É comum que os novos convertidos vejam as grandes verdades essenciais da profissão de fé cristã de modo imperfeito, quanto as evidências pelas quais as descobrem. Ou eles vê­em apenas algumas das sólidas evidências, deixando de ver muitas outras; ou, mais freqüen­temente, recebem a verdade sob evidências inadequadas e insuficientes, à princípio, e, então, prosseguem para um tipo de mistura; recebendo a verdade firmados em algumas evidências válidas e suficientes, junto com outras evidências inadequadas. Entretanto, você deve crescer para além desse entendimento infantil, e ver evidências maiores e mais seguras do que as que via anteriormente. Quando você compreender mais dessas sólidas evidências que ante­riormente não conseguia ver, e colocar menos ênfase sobre as evidências menos significati­vas, e abandonar aquelas evidências que não são válidas (que na verdade não são evidênci­as); então seu entendimento será mais confirmado na verdade - e nisto consiste a parte prin­cipal do seu crescimento.
Assim aconteceu com os samaritanos de Sicar: “Muitos samaritanos daquela cidade cre­ram nele, em virtude do testemunho da mulher, que anunciara Ele me disse tudo quanto te­nho feito”. Esta foi uma fé inicial, baseada em uma evidência fraca. Entretanto, “muitos outros creram nele, por causa da sua palavra, e diziam à mulher: Já agora não é pelo que dis­seste que nós cremos; mas porque nós mesmos temos ouvido e sabemos que este é verdadei­ramente o Salvador do mundo”. Este é um exemplo claro de confirmação e crescimento, que os levou a crer e conhecer uma mesma verdade que antes creram; mas antes esta verda­de era crida com base em uma evidência mais fraca; e agora, sob uma evidência mais forte.
O mesmo ocorreu com Natanael. Pela persuasão de Filipe, ele foi conduzido a Cristo, mas quando percebeu sua omnisciência, visto que conhecia o coração e acontecimentos que estavam distantes e fora do alcance do conhecimento ordinário, Natanael é confirmado, e diz, “Mestre, tu és o Filho de Deus, tu és Rei de Israel”. Contudo, Cristo lhe diz que ainda havia evidências muito mais fortes a serem reveladas, as quais produziriam uma fé mais confirmada e forte: “Porque te disse que te vi debaixo da figueira, crês? Pois maiores cousas do que estas verás. E acrescentou: Em verdade, em verdade vos digo que vereis o céu aberto e os anjos de Deus subindo e descendo sobre o Filho do homem”.
Não há um só crente, dentre muitos milhares, o qual tenha, de imediato, percebido ple­namente as sólidas evidências da doutrina cristã. Entretanto, é preciso crescer mais e mais em discernir aquelas razões para a verdade que crê; as quais, à princípio, não discernia ade­quadamente. Não é a fé mais confiante que se revela sempre como a fé mais forte e confir­mada. Deve haver fundamentos e evidências seguras em suporte a esta confiança; do con­trário, tal confiança pode logo ser abalada, e não é sadia, mesmo que parece não se abalar. Quanto a isso, os novos convertidos devem ser advertidos, dessa perigosa cilada do engana­dor, porque à princípio, a própria verdade é freqüentemente recebida sob evidências ou bases fracas e deficientes. É costume do diabo e dos seus instrumentos enganadores, mostrar aos novos convertidos as fraquezas dessas evidências iniciais, e, então, levá-los a concluir que suas evidências de fé se reduzem a nada; pois é muito fácil persuadir tais pessoas que as ver­dades em que crêem não têm evidências mais sólidas do que as que conseguiram ver, já que não discerniram outras melhores. Os novos convertidos são facilmente levados a superesti­marem seus conhecimentos, como se não houvessem razões melhores para a verdade, do que as que eles alcançaram; e a acharem que outras pessoas não vêem mais do que eles. As­sim, algumas dessas pobres almas, abandonam a verdade, na qual deveriam ser edificados e confirmados, e consideram como argumento contra a verdade, aquilo que é apenas uma prova da própria fraqueza deles.
Eu conheci pouquíssimas pessoas que se voltaram para alguma heresia ou seita, cuja causa não tenha sido esta. Eles, à princípio, professavam a verdade, mas não firmados em razões seguram e firmes. Eles professavam a verdade firmados em razões insuficientes. En­tão, vem algum enganador e desacredita os argumento em que se firmavam, e então, não tendo razões melhores, abandonam a verdade, concluindo que tudo não passava de engano. É como se na infância, eu reconhecesse meu pai apenas pelas roupas que usa; e então, cres­cendo um pouco mais, alguém me dissesse que eu fui enganado, e que esse não era o meu pai, e para me convencer, vestisse outro homem com as roupas dele; e assim, por causa dis­so, eu fosse tolo o suficiente para admitir que estivesse enganado e que meu pai não era re­almente meu pai. Como se a paternidade de meu pai fosse falsa, porque as razões pelas quais eu a reconhecia eram insuficientes. É isto o que acontece com estas pobres almas, as quais pensam que a descoberta das suas próprias imperfeições e a refutação de seus próprios ar­gumentos tolos é uma refutação das verdades de Deus que sustentam. Um crente forte e bem alicerçado, por sua vez, defenderia a verdade de Deus contra inimigos mais fortes e sa­gazes; ou pelo menos apegar-se-ia firmemente a ela.
Esta é a primeira parte do seu crescimento em conhecimento: quando você pode ver mais e melhores evidências para a grande verdade do cristianismo do que podia ver antes.

2. Além disso, você deve progredir de modo a obter uma apreensão mais clara das mesmas razões e evidências da verdade que via antes. Pois mesmo que o crente fraco te­nham os melhores argumentos e bases no mundo, ainda assim, ele tem uma visão tão obscu­recida deles, que eles quase não afetam seus sentimentos. As melhores razões do mundo po­dem operar muito pouco naqueles que as compreenderem apenas superficialmente. Há vari­edade de graus de conhecimento, não apenas de uma mesma verdade, por causa da diversi­dade de evidências; mas de uma mesma evidência e razão de uma verdade. Eu me lembro muito bem de ter por muitos anos um argumento para uma importante verdade, e de ter feito uso dele, e que, embora se tratasse de um bom argumento, eu tinha apenas uma apreensão superficial da sua força. Apenas muitos anos mais tarde, meus estudos me deram luz, e obti­ve uma apreensão tão clara da força do mesmo argumento, o qual já conhecia há tanto tem­po, que ele me confirmou e me satisfez tanto, como nunca antes.
Eu rogo a vocês, cristãos, que considerem a importância da verdade. Não é o mero co­nhecimento superficial da verdade que lhe servirá; mas um conhecimento verdadeiro e sólido dela. Nem tampouco é o mero ouvir e entender as melhores bases e razões ou provas do mundo que lhe será útil; a menos que tenha uma sólida apreensão dessas provas e argumen­tos. Um homem de posse dos melhores argumentos, pode esquecer a verdade, porque não tem uma boa compreensão desses argumentos. Como um homem que tem as melhores ar­mas do mundo pode ser morto, por não ter o vigor ou habilidade para usá-las. Eu lhes digo que, ainda que você soubesse todas as verdades da Bíblia, você poderia crescer muito no co­nhecimento dessas mesmas verdades que já sabe.

3. Além disso, um crente novo e não confirmado, embora possa ver todas as verdades fundamentais, e conhecer boas evidências e razões delas; pode, contudo, ser ignorante quanto a ordem correta e lugar de cada verdade. É raro encontrar novos professos que entendam as verdades necessárias metodicamente - e isto é uma grande falta. Isto porque muito da utilidade e excelência de verdades particulares consiste na relação que têm umas com as outras. Isto, portanto, consistirá em parte importante da sua confirmação e cresci­mento no entendimento: ver o corpo de doutrinas cristãs em sua unidade, visto que embora diversas, estão todas unidas em um sistema perfeito. É preciso, portanto discernir em que sentido uma doutrina se relaciona com as demais, e qual é o seu devido lugar dentro do corpo doutrinário bíblico como um todo.
Há muita diferença entre a visão das diversas peças espalhadas de um relógio desmonta­do, e a visão dessas mesmas peças montadas e em perfeito uso e movimento. Ver um pino aqui e uma outra peça acolá, sem nunca tê-los visto montados em seus devidos lugares, não nos dão muita satisfação. É o sistema e a ordem das doutrinas sagradas que precisão ser dis­cernidas; qual o uso particular que têm dentro do sistema como um todo, e qual a relação que mantêm com as demais doutrinas. Este é o único meio pelo qual a verdadeira natureza da teologia juntamente com a harmonia da perfeição da verdade pode ser compreendida. Cada verdade em particular será muito melhor compreendida quando vista em seu lugar e ordem. Pois uma verdade ilustra de modo extraordinário outra verdade elucidando-a para que possamos compreendê-la.
Na verdade, o próprio coração e vida de vocês não ficarão em boa ordem se a ordem das verdades recebidas for mal compreendida. Pois as verdades de Deus são os próprios instru­mentos da santificação de vocês; a qual, não passa do efeito sobre o entendimento e vontade de vocês dessas verdades pelo Espírito Santo. As verdades são o selo e a alma de vocês são a cera; a santidade, é a impressão feita. Se vocês receberem apenas algumas verdades, terão apenas uma impressão parcial. De fato, as verdades do cristianismo são tão coerentes, e fa­zem sentido pelo necessário sistema que formam, que você não pode receber sinceramente uma delas sem receber cada uma das verdades essenciais do fé cristã. Se vocês as receberem de modo desordenado, a imagem que produzirão nas almas de vocês serão igualmente de­sordenadas; como se os membros dos corpos de vocês fossem unidos de modo monstruoso.
Estudem, portanto, para poderem crescer com um conhecimento mais metodológico das mesmas verdades que já receberam. Embora não estejam suficientemente preparados para discernirem todo o corpo teológico na ordem devida; ainda assim, aprendam o máximo que puderem alcançar, na ordem correta e lugar devido de cada parte. Como na anatomia, ainda que seja difícil para o melhor médico discernir o curso de cada veia e artéria, ainda assim eles podem facilmente discernir o lugar e ordem das veias e artérias principais; assim também com relação ao conhecimento das doutrinas bíblicas. Homem algum pode obter uma visão perfeita do todo, enquanto não alcançar o estado de perfeição; ainda assim, todo verdadeiro crente tem o conhecimento das doutrinas essenciais, e podem conhecer a ordem e lugar de todas elas.

4. Outra parte da sua confirmação e crescimento no entendimento, consiste em discernir as mesmas verdades de modo mais prático do que antes, e perceber a utilidade de cada verdade, para que elas façam sua obra em seu coração e na sua vida. Nunca foi a vontade de Deus que mera especulação se constituísse no propósito das Suas revelações ou da nossa fé. Teologia é uma ciência efetivamente prática. Portanto, as verdades devem ser conhecidas e cridas, a fim de que o bem seja recebido, e uma santa transformação operada por elas no coração e na vida. Até a própria doutrina da Trindade é prática, sendo a fonte de doutrinas cuja prática são mais facilmente discernidas. Não há um artigo da nossa fé que não tenha uma obra especial a realizar no nosso coração e na nossa vida; eles são especialmente ade­quados para esta obra.
Pois bem, o entendimento dos novos na fé, embora discirnam muitas verdades, vêem pouco da obra a ser realizada por elas, e da utilidade de cada uma dessas verdades na opera­ção dessas obras. Isto, portanto, deve ser objeto do seu labor diário, e nisto você deve cres­cer.
Um dono de casa pode conhecer tantas ervas, flores e frutos quanto um farmacêutico, e pode até chamá-las pelo nome, e reconhecer a aparência e beleza delas. Contudo, ele sabe pouco ou nada com relação a utilidade, para o que servem, exceto que servem para alimentar o gado. Já o farmacêutico sabe que esta erva serve para esta doença e aquela para outra do­ença, e sabe como fazer uso dessas mesmas ervas para salvar a vida das pessoas, enquanto que outros homens as pisam como se fossem inúteis. Assim também, muitos homens não convertidos, podem conhecer externamente doutrinas sagradas, mas não sabem que uso po­dem fazer delas. O crente fraco, por sua vez, conhece menos da utilidades dessas doutrinas, do que um crente maduro e confirmado.
Aprendam diariamente mais e mais, a fim de conhecerem para que serve cada verdade; e compreenderem que esta verdade é apropriada para o exercício e fortalecimento de tal graça (virtude), e esta outra é excelente remédio contra tal ou tal doença da alma. Cada folha da Bíblia tem nela poder curador. Elas são as folhas da árvore da vida. cada sentença é boa para alguma coisa. “Toda Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra”. Nenhuma só palavra das Escrituras é inútil.

5. Além disso, você deve crescer não apenas no conhecimento da utilidade das doutri­nas, mas em como usá-las, a fim de que possa se beneficiar do valor delas. Muitas pessoas sabem para o que servem as ferramentas dos trabalhadores, embora não saibam como usá-las. Muitos conhecem a utilidades e valor das ervas e drogas, contudo não sabem como fazer um remédio delas e aplicá-las devidamente. É preciso muita habilidade para conhecer a peri­odicidade, dosagem e o que é apropriado para um e para outro (paciente ou doença), a fim de que se possa fazer a necessária variação que a diversidade de condições requer. Assim como é necessário habilidade para que os pastores, “manejem corretamente a Palavra de Deus, e falem a palavra apropriada ao fraco, e dêem aos filhos seu alimento na hora certa”; assim também é requerido habilidade para fazer isso por si mesmo, e conhecer que porção da Escritura diz respeito a você, e quando e em que dosagem aplicá-la, e em que ordem, e com que objetivos usá-la, de modo que concorra para o seu próprio bem.
Você pode crescer nesta habilidade enquanto viver. Por mais que conheça verdades há muitos anos, pode ainda crescer quanto a habilidade para usá-las apropriadamente. Oh, que crentes excelentes seríamos nós, se apenas tivéssemos essa santa habilidade para aplicar corretamente as verdades bíblicas. Nós temos toda a armadura de Deus para vestir e usar. A questão é como usá-la. A mesma espada do espírito nas mãos de um forte e habilidoso crente pode fazer muito, enquanto que nas mãos de um crente fraco e inábil pouco ou quase nada poderá fazer. Um jovem médico pode conhecer os mesmos medicamentos que um médico hábil e experiente. Mas a grande diferença está na habilidade para usá-los. É isto que pode torná-lo rico em graça: quando você cresce na habilidade para usar as verdades de Deus.

6. Ademais, seu entendimento pode aumentar bastante, ao conhecer as mesmas verda­des mais experimentalmente do que antes - eu me refiro às verdades capazes de serem co­nhecidas experimentalmente. A experiência nos fornece um modo de conhecimento muito mais satisfatório do que o alcançado sem ela. Conhecer por ouvir dizer é como conhecer um país por um mapa; enquanto que conhecer por experiência é como conhecer o mesmo país pessoalmente. Um viajante experiente, ou soldado ou médico ou governador, tem um co­nhecimento diferente do que o da maioria dos homens eruditos, sem experiência podem ter - um conhecimento que dá segurança a pessoa. Assim também vocês podem crescer no co­nhecimento das mesma verdades que já conhecem há muito tempo. Quando tiverem “a ex­periência de que o Senhor é bondoso,” vocês o conhecerão mais experimentalmente do que o conheciam antes. Quando provarem a doçura das promessas, do perdão dos pecados, da paz com Deus, e das esperanças da glória, vocês terão adquirido um conhecimento mais ex­perimental das riquezas da graça do que tinham antes. E quando tiverem vivido por um tem­po em comunhão com Deus, de modo íntegro e incontaminados no mundo, vocês conhece­rão a natureza e valor da santidade por meio de um conhecimento mais experimental e satis­fatório do antes. Nisto consiste a confirmação e crescimento em conhecimento.

7. Finalmente, vocês devem se esforçar para crescer na estima que têm das mesma ver­dades que conheciam antes. Isto será uma conseqüência das atitudes já mencionadas. Uma criança que encontra uma jóia, pode dar valor a ela pela beleza de seu brilho; no entanto, pode estar avaliando-a muito aquém do seu real valor. No início da sua nova vida, você pode ver tanta sabedoria e bondade em Deus que desprezará o mundo por causa dEle; pode reco­nhecer tanta necessidade de um salvador e tanto amor e misericórdia em Jesus Cristo, ao ponto de ter seu coração atraído para ele; pode ver com tanta certeza a gloriosa excelência da vida por vir, que poderá avaliá-la até mesmo mais do que sua própria vida. Contudo, há nisso tudo um tesouro tão inescrutável, que você jamais poderá avaliá-lo a altura do seu va­lor, pois há mil vezes mais excelência em tudo o que vocês têm visto de Deus, de Cristo e da glória a ser discernido. Há mil vezes mais beleza na santidade do que vocês já apreenderam. O pecado, por sua vez, é mil vezes pior do que já perceberam. Assim, ainda que vivessem mil anos, ainda assim poderiam crescer na estima dessas coisas que conheceram desde o primeiro dia da verdadeira conversão de vocês. Quanto mais profundamente cavarem esta mina, mais preciosos se revelarão seus tesouros. Há um oceano de excelência em um artigo da nossa fé, e vocês nunca encontrarão a outra margem ou seu fundo, até chegarem aos céus; quando descobrirão que ele não tem outra margem nem fundo.
Com isso eu mostrei a vocês o que é necessário para a confirmação e crescimento com relação ao entendimento, quanto as verdades que conheceram desde o princípio. Agora, acrescentarei que vocês também precisam empenhar-se para conhecer muitas outras verda­des que não conheciam à princípio, e a alcançar o máximo que puderem da vontade revelada de Deus, e a não se satisfazerem com as verdades essenciais; pois todas as revelações divinas são preciosas e de grande utilidade, e não podem ser negligenciadas. O conhecimento de muitas outras verdades são de utilidade, também, para o nosso claro entendimento das ver­dades essenciais; e, também, para que nos apeguemos firmemente e pratiquemos essa verda­des essenciais. “as coisas encobertas pertencem ao Senhor nosso Deus; porém as reveladas nos pertencem a nós e aos nossos filhos”
Com relação a isso, devo dar-lhes mais alguns conselhos:

1. Que vocês procedam na ordem devida; dos pontos fundamentais àqueles que se se­guem; e não pulem os pontos que se seguem em necessidade e importância, para questões mais elevadas e menos necessárias, antes que estejam preparados para elas.
2. Atentem, também, para que recebam todas as verdades seguintes que forem ensinadas a vocês, como que fluindo e intimamente ligadas às verdades essenciais. Prosseguir desorde­nadamente tem provocado enormes malefícios a almas de milhares, quando se envolvem em controvérsias com relação a assuntos menores, antes de haverem compreendido a abundân­cia de assuntos mais necessários os quais deveriam ter compreendido antes. Seguir por esse caminho será um desperdício ou, pior, engana o entendimento ao invés de informá-lo. Isso também perverte a própria vontade, produzindo no homem uma atitude herética, orgulhosa ou um espírito perverso. E, então, fatalmente o desencaminhará na prática, e fará com que, como um homem iludido, seja zeloso na prática do mal, pensando que está fazendo o bem.
Até nas coisas comuns reconhece-se que é preciso aprender e fazer as coisas na ordem devida, caso contrário, você estará apenas se tornando um tolo. Você alcançará o topo de uma escada ou ladeira sem começar pela parte mais baixa? Semeará você a terra antes de adubá-la e ará-la? Ou pode você colher antes de semear? Ensinará você aos seus filhos he­braico, grego e latim antes que aprendam sua própria língua? Ou lerão eles os livros mais di­fíceis antes de aprenderem os mais fáceis? Assim também vocês não podem aprender a res­peito das difíceis controvérsias teológicas, ou sobre a exposição de profecias obscuras, ou dúvidas doutrinárias, sem que antes tenham aprendido as muitas, grandes e necessárias ver­dades que precisam ser compreendidas primeiro. Homens sábios sentem pena e ficam enver­gonhados ao ouvir pessoas récem-convertidas e presunçosas fazendo exposições confiantes sobre os Livros de Daniel, Apocalipse, Cantares e outros similares, ou se envolvendo em discussões a respeito do livre arbítrio, predestinação, ou muitas outras controvérsias de nossa época, quando são ignorantes com relação a centenas de verdades sobre as alianças, justifi­cação e assim por diante, as quais deveriam ser conhecidas antes que possam alcançar as demais.
Pelo que disse até aqui, vocês devem ter compreendido que, embora devamos alcançar o máximo que pudermos em conhecer todas as verdades necessárias reveladas; a parte princi­pal do crescimento no conhecimento, uma vez convertidos, consiste não em conhecer mais do que conheciam antes, quanto ao número de verdades, mas em conhecer melhor as mes­mas verdades fundamentais que conheciam à princípio. Esta é a coisa principal que eu ensi­naria a vocês aqui. Visto que as verdades essenciais do cristianismo foram o instrumento da conversão de vocês, e foram mais necessárias e úteis a vocês do que milhares de outras; o crescimento e confirmação das almas de vocês dependerá mais de conhecerem mais profun­damente essas mesmas verdades, do que de acrescentar milhares de outras que ainda não conhecem. Portanto, aceitem este conselho, se é que realmente almejam a paz e o crescimen­to de vocês: não negligenciem conhecer outras verdades; mas gastem muitas e muitas horas empenhando-se em conhecer melhor as grandes verdades que receberam, para cada hora gasta à procura de conhecer outras verdades que ainda não conhecem. Acreditem, este é o caminho mais certo e seguro.
Se vocês já conhecem a Cristo crucificado e não conhecem certas controvérsias com rela­ção a governo da igreja e outros assuntos não essenciais; será mais útil para o seu crescimen­to no conhecimento compreender um pouco mais à respeito de Cristo crucificado, o qual já conhece, do que conhecer esses outros assuntos que ainda não conhece. Se você já possuísse alguns milhões em ouro, e nenhum centavo em prata, lhe enriquecerá muito mais obter mais uma bolsa cheia de ouro do que uma cheia de prata. O homem que tem medida dobrada do conhecimento de Deus em Cristo, e a mais clara, profunda e eficaz apreensão das riquezas da graça e da glória por vir, e ainda assim, nunca ouviu falar de Scotus, ou Ockam ou da Suma Teológica de Tomás de Aquino, é muito mais rico em conhecimento, e muito mais sábio do que aqueles que têm estas controvérsias na ponta da língua, mas alcançaram apenas metade da clareza e solidez do conhecimento de Deus, de Cristo, da graça e da glória. Há suficiente em qualquer dos artigos da nossa fé, em qualquer dos atributos de Deus, em um dos benefícios de Cristo, em uma das graças do Espírito, para mantê-lo estudando e cres­cendo em conhecimento por toda a sua vida. O conhecimento deve ser avaliado de acordo com o seu uso e com a dignidade do seu objeto, e não pelo número e sutileza de suas no­ções. Portanto, eu rogo a vocês, que são jovens e fracos na fé, que se empenhem muito mais para crescer em obter uma intimidade maior com a mesma fé que receberam, do que em se tornarem íntimos de questões controvertidas secundárias que ainda não conhecem. Os ho­mens costumam chamar estes assuntos de questões elevadas, porque são mais difíceis; mas certamente os artigos de fé de vocês são muito mais elevados quanto a excelência, embora venham primeiro na ordem devida de aprendizado; assim como o alicerce é a parte funda­mental de um prédio, sendo construído primeiro; mas é ele que deve sustentar todo o resto.
Do que foi dito vocês podem observar quão reprovável e diferentemente de verdadeiros cristão falam as pessoas que dizem que não se interessam em ler tais e tais livros e ouvir tais e tais ministros, porque lhes dizem apenas o que já sabem. Quando um ministro insiste e enfatiza as verdades maiores e mais necessárias, é um sinal de que ele está no caminho certo para a edificação e enriquecimento do conhecimento de vocês. Nós não temos um Deus novo para pregar a vocês, nem um novo Cristo, nem um novo Espírito, nem uma nova igre­ja, nem uma nova fé, nem uma nova aliança batismal, nem um novo céu, ou uma nova espe­rança, ou uma nova felicidade, para apresentar. Alguns pensam que aprenderam rapidamen­te os artigos essenciais de fé, e há muito alcançaram as doutrinas mais elevadas; não demora muito para que as próprias Escrituras sejam coisa do passado para tais pessoas, e sejam colo­cadas de lado, como um erudito que estudou um livro e passa para o próximo. Uma oração marca a advertência do apóstolo: “Não vos deixeis envolver por doutrinas várias e estranhas, porquanto o que vale é estar o coração confirmado com graça.” “para que não mais sejais como meninos, agitados de um lado para outro, e levados ao redor por todo vento de doutri­na, pela artimanha dos homens, pela astúcia com que induzem ao erro.”